Tenho um “bichinho do mato” em casa. Como lidar com a timidez do meu filho?

Fabíola Sperandio T. do Couto 

O mundo atual ágil e dinâmico tem sido destacado por uma enxurrada de laudos de crianças hiperativas, ansiosas, falantes e muitas vezes sem limites. Mas, e quanto à criança retraída, o que tem sido falado?

Crianças que não gostam de evidência ficam assustadas quando a atenção recai sobre elas. Crianças que expressam pouco através da fala, possuem um tom de voz baixo e muitas vezes projetam a voz para dentro, são crianças tímidas. Ser uma criança tímida é um problema? Não! Porém precisamos ajudá-la para que isso não traga dificuldades nas relações sociais e no aprendizado. A família precisa identificar e respeitar o modo de ser dessa criança. Se o “estado tímido” não a leva a se isolar, a própria família e a escola poderão juntas ajudá-la. Agora, se o isolamento se tornar frequente e aparente, será necessário a ajuda de um profissional para trabalhar ferramentas de desenvoltura com a criança.

Quando falo em isolamento refiro-me ao isolamento social em festividades, brincadeiras, viagens. Toda criança pode apresentar momentos em que rejeite o coletivo, desde que isso não seja uma regra e, sim, uma exceção. A intervenção neste caso é de suma importância no período de formação de vínculos sociais (início da idade escolar).

A retração social ou timidez geralmente se destaca por volta dos primeiros anos de vida. Quando a criança é inserida na escola, esse momento promove o primeiro estado de independência familiar. Ao chegar ao ambiente escolar e se deparar com pessoas diferentes da família, a criança passará a enfrentar seus erros e acertos nas relações. É neste momento, também, que ela começa a descobrir regras diferentes de sua casa. Com as regras chegam as censuras e a autocensura. Inicia-se aí o primeiro receio de se decepcionar, de não corresponder o de desagradar ao outro. Mesmo tão pequena, para não se aventurar em erros e ser criticada pelo outro, a criança tímida recua e se reserva. Ela não se arrisca para não ser corrigida porque ao ser corrigida, sente enorme vergonha e dor por ter frustrado alguém. Reservar-se para não ser exposta, é um caminho que não lhe fará bem. A timidez é caracterizada pela preocupação excessiva com suas percepções, atitudes, reações e por pensamentos demasiados. Mesmo crianças de um ano e meio já podem apresentar esse quadro.

São dois aspectos que podem colaborar para o desencadeamento de uma criança tímida: o ambiente familiar (dinâmica da família) e o hereditário (carga genética). O ambiente familiar castrador e repressivo, que não permita a experimentação, pode trilhar esse caminho da não exposição e aventura. Já a carga genética refere-se à herança da personalidade de um dos seus genitores. Exatamente por esses fatores que nos deparamos com pessoas extrovertidas e tímidas em nossa sociedade. Uma criança tímida inserida em uma família extrovertida, aos poucos ela irá vencendo a sua timidez pelo estímulo familiar. Uma criança tímida inserida em uma família reservada, a tendência natural será a criança se retrair cada vez mais.

O papel da família é decisivo para o combate da timidez da criança. Ao gerar segurança e aceitação do jeito de ser, a criança se sentirá livre para se arriscar mais nas relações sociais e diminuirá a ansiedade por medo de errar e se decepcionar. Vale ressaltar que uma criança extrovertida e social, mas, que ao mesmo tempo demonstra timidez temporária em alguma situação ou local, isso é perfeitamente aceitável. Aqui vão algumas dicas para as famílias de crianças que estão apresentando um quadro de timidez:
• promova atividades coletivas onde a criança terá que se relacionar com o outro: parque do condomínio, clube, uma passeio no bosque, locais em que ela encontrará outras crianças para brincar e socializar-se;

• atraia amiguinhos para passeios em sua casa, cinema, teatro e observe o movimento de integração. Você poderá dar dicas após observá-la, para que os próximos encontros sejam ainda mais produtivos;

• atue para autonomia da criança. Dê pequenas tarefas onde ela possa caminhar sem você. Exemplo: pegar uma bola que caiu no meio de um grupo de crianças; ir até o caixa de uma lanchonete fazer o seu pedido; escolher um livro, em uma livraria, procurar um atendente para informações e se dirigir ao caixa para o pagamento; entregar o convite do seu aniversário e dar informações sobre a festa aos familiares; dar recados entre outros afazeres que permitam caminhar sem a sombra de um tutor. Críticas e brincadeiras (que parecem inocentes, mas não são) não colaboram com as crianças. Evite expô-las. Ações e falas em público só pioram o quadro. Portanto, jamais faça comentários como: meu filho é um bichinho do mato; fala filho com as pessoas; parece que não dou educação; ele(a) me envergonha, porque parece mal educado; eu ensino cumprimentar, mas não aprende; ele(a) é tímido e isso não me puxou; tímido igual fulano, credo! Geralmente as pessoas percebem logo o perfil das crianças. Reconhecem as extrovertidas e as tímidas. O importante é saber respeitar e trabalhar para ajudar a obter o equilíbrio a fim de que tenha um desenvolvimento sadio e harmônico.


Fabíola Sperandio T. do Couto é Pedagoga, Psicopedagoga e Terapeuta de Família e Casais. Atua em educação desde 1984 e em consultório desde 1999. É Diretora Pedagógica de uma instituição privada do Maternal ao 9ºano, palestrante e consultora na área educacional e familiar. Escreve semanalmente para o blog Educar Faz Parte (Organização Jaime Câmara/Globo/Ludovica).



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