A cada dia que passa, fico impressionada como somos vulneráveis aos termos. Vocês já observaram o quanto o termo bullying tem sido usado no mundo todo e a quase todo momento?
Bullying são ações maldosas e repetitivas, feitas por uma ou mais pessoas. Se são ações intencionais e repetitivas, um fato isolado não pode ser considerado bullying. Fatos corriqueiros da fase de crescimento também não são bullying. E por que agora alguns pais recorrem à escola por quaisquer motivos e utilizam essa palavra?
A criança de dois anos chega mordida a sua casa: “Ela está sofrendo bullying”. Vamos à escola. Desde a minha época escolar, as crianças do maternal que se encontravam na fase oral, mordiam umas às outras. Às vezes, mordiam até como sinal de amor. Amam tanto que dava vontade morder. E isso não mudou. É também uma forma de expressar carinho.
A minha maior preocupação é com o excesso de proteção que impede os filhos de conviverem com os desentendimentos e frustrações característicos de cada fase. Pais que a cada pequeno atrito tomam frente da situação, nomeiam o acontecimento, buscam a escola para exigir providências. Muitas vezes, não se abrem para ouvir os dois lados e, com isso, impedem os filhos de lidar com os sentimentos que a convivência oferece: medo, raiva, alegria, tristeza, revolta, justiça, injustiça. Essa mistura é que nos faz amadurecer. Se forem impedidos de senti-los, como irão lidar com isso durante a adolescência e a fase adulta?
Depois, nos surpreendemos quando deparamos com o jovem que não sabe lidar com as emoções ao vivenciar as seguintes situações: uma amiga que agora não quer mais a sua amizade; um grupo de colegas que foi ao cinema e não o convidou; um fora de uma paquera. Diante disso, procura fugir desses problemas através de vícios (drogas, por exemplo), deseja interromper a vida, isola-se no quarto, fica agressivo, demonstra rebeldia. Será que já paramos para pensar que não podemos impedir os nossos filhos de crescerem?
A violência exposta pelos veículos de comunicação nos assusta e, por muitas vezes, nos vemos tão distantes dela, como se não pudesse atingir nossa família. Como a violência praticada por um garoto de 10 anos, excelente aluno, educado, bom filho, que, de repente, mata a professora e depois se mata, deixando todos por entender o que o motivou a ter essa atitude. Esse mesmo aluno, oriundo de uma escola pública e reconhecida pelo excelente desempenho educacional por índices e exames estaduais e nacionais, no bairro Mauá, em São Caetano, marcou essa instituição com uma tragédia.
Violência como a de Suzane, que nasceu numa família de classe média alta da capital de São Paulo e morava em um bairro nobre da zona sul paulistana (Brooklin). Filha do engenheiro Manfred Albert Freiherr von Richthofen e da psiquiatra Marísia von Richthofen. Seu pai, nascido em Erbach (Alemanha), emigrou para o Brasil após um convite de trabalho, recebido devido a sua capacitação como engenheiro. Essa jovem foi cúmplice na morte dos pais, demonstrando frieza e crueldade. O que a fez praticar um ato tão violento contra seus próprios genitores?
Realmente, essa violência toda exposta através dos veículos de comunicação parecem distantes até o momento em que aquilo que vi acontece ao meu lado. As interrogações surgem de várias partes: “Por quê? Por que ele fez isso? O que deixei de fazer? O que não percebi?”
Não percebi que impedi meu filho de viver cada fase de forma saudável, resolvendo suas intrigas, seus relacionamentos de amizade cheios de altos e baixos. Não o deixei experimentar a conquista de novos amigos; fui à frente e quase implorei para os amigos o aceitarem. Não o deixei experimentar as perdas e depois, deliciar-se com os ganhos. Deixei de ouvi-lo e o enchi de “Faça assim”, “Faça assado”, “EU VOU LÁ!” Ele só queria ser ouvido e você só queria falar.
Vamos deixar nossos jovens viverem! Não vamos querer amenizar as passagens necessárias para que eles se tornem adultos bem resolvidos, felizes e autônomos.
Lembrem-se de que as nossas gerações, cito as décadas de 1970, 1980 e 1990, não tinham pais tão protetores, que visitavam as escolas por motivos corriqueiros. Tínhamos pais que atribuíam aos filhos tarefas como as de resolver seus problemas de amizade na escola, negociar datas de entrega com os professores, sanar suas dúvidas com os educadores, procurar ter atitudes assertivas que pudessem gerar um sentimento na criança de que conseguiu e foi capaz de resolver as situações que apareceram em seu caminhar. Pais que distribuíam funções domésticas como arrumar a própria cama, levar o prato até a cozinha, ajudar a cuidar dos animais e não permitiam desrespeitos às pessoas de profissões mais simples.
Por que mudamos tanto em nossa forma de educar? Vamos resgatar aquilo em que acreditamos de nossa educação; aquilo que nos ajudou a ser o que somos hoje – pessoas de bem. Não aceitar como normal o que nos apresentam pela TV, nas escolas, nos condomínios e em nossa própria família no que diz respeito ao abuso de autoridade, à imoralidade e ao desrespeito às diferenças.
Outro fator importante é que o bullying não ocorre somente na instituição escolar. Bullying pode ocorrer entre membros da família (irmãos, primos, tios, avós), na religião em que estamos inseridos (colegas do grupo da catequese ou no retiro espiritual), no prédio, rua ou condomínio onde residimos, no clube que frequentamos, cursos extras (futebol, ballet, inglês) entre tantos outros locais que frequentamos assiduamente. Vejo famílias perdendo um tempo precioso investigando a escola quando o filho se mostra arredio, triste ou agressivo quando deveria ampliar a busca em todos os locais que a família ou a criança se relaciona.
A Lei nº 13.185, de 6 de novembro de 2015, instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying) e deverá ser aplicada a todos. Fico pensativa quando vejo os programas televisivos debatendo a lei focando na instituição escolar e ignorando as outras possibilidades citadas acima. Se não ampliarmos o olhar, admitindo que todo local que reúne pessoas é possível ter ações de bullying, deixaremos de acudir crianças, jovens e adultos que são acometidos desta ação dolorosa que muitas vezes até os paralisam.
Suplico para que, em vez de focarmos nas consequências para quem pratica ou fomenta práticas de bullying, nos concentremos na prevenção e em desenvolver ferramentas de defesa. Vamos esclarecer e promover o combate ao bullying e, para que isso aconteça, os adultos precisam motivar suas crianças à busca do equilíbrio emocional e ao enfrentamento. Toda vez que saímos como leões e leoas em defesa de nossas crias, nós a impedimos de amadurecer. Estejam sempre ao lado, instruindo e promovendo suporte, mas jamais agindo por eles. Outro alerta é que precisamos estar abertos para conhecer os vários lados da história. Não compre uma única versão como verdade absoluta. Vá atrás da real situação. Investigue, avalie e se posicione.
O nosso papel é sempre criar condições de crescimento aos nossos filhos. Trabalhar os valores éticos e morais promoverá o senso de justiça. Ser justo é buscar o equilíbrio entre a razão e emoção. Hoje estamos tão focados em nossos direitos que acabamos por não observar se cumprimos os nossos deveres. Pensem nisso!