“Tia Fabíola, eu estou sangrando. Estou com medo. Não queria que tivesse acontecido isso comigo. Sinto dores na barriga. Minha roupa está suja e estou com vergonha dos meus colegas. Quero ficar com você.”
Assim começou minha manhã após o período de recesso pascal. Uma criança de 10 anos muito assustada com a nova realidade: transição da puberdade para a adolescência.
Com muito carinho, a acolhi e perguntei o que ela sabia sobre o ocorrido. Ela disse que a irmã mais velha falava sobre estar menstruada e ter cólicas, mas não esperava por isso agora. Na cabecinha dela, isso demoraria mais uns dois anos. Acreditava que, pelo mesmo motivo, a mãe nunca conversara com ela também. A partir desta narrativa, fui a acalmando e explicando o que é a menarca. Expliquei que era o início de um marco em sua vida. Tentei mostrar a beleza do crescimento e transição para, só depois, ir para os aspectos práticos da situação.
À medida que eu ia falando que a puberdade é uma fase de mudanças físicas que marcam a transição da infância para a adolescência, e, com essa passagem, o corpo ia dando sinais de mudanças, ela ia se identificando. Falamos sobre o estirão, mudança do peso, amadurecimento sexual e repentinas mudanças emocionais (alteração de humor, impaciência, choro fácil, irritabilidade). Sentia que a medida que se identificava ela se aproximava de mim.
Logo, ela foi falando do susto que teve ao ver os primeiros pelos na região pubiana e embaixo dos braços e o início do crescimento dos seios. Disse que começou a se sentir estranha e envergonhada. Pegava uma pinça e arrancava. Não queria “ser descoberta”. Continuei mostrando com naturalidade a beleza da natureza feminina. Fui colocando doçura e poesia. Isso a acalmava. Continuei falando do que veria de mudanças em seu corpo a partir de agora: os quadris se alargarão; a textura da pele mudará temporariamente, tornando-se mais propensa a espinhas; os ovários, as trompas e o útero também estão se transformando e crescendo para que a faça uma mulher linda.
Ao comentar que algumas colegas nem pelo possuíam, mostrei que cada uma tem o seu tempo e que provavelmente achou que ainda estava distante esta realidade dela porque a irmã ficou menstruada mais tardiamente (contou que foi aos quatorze). Pontuei que a maioria das meninas começa a se desenvolver aos 10 anos e tem sua primeira menstruação até dois anos depois. Mas existem as que ficam menstruadas bem cedo, com 9 ou 10 anos, e algumas bem mais tarde, aos 14 ou 15 anos. Que isso era normal e dependia do organismo de cada uma.
Falar deste assunto com meninas tão jovens e ainda com uma conotação positiva, não é uma tarefa fácil. Vê-la desconfortável e envergonhada me motivou a desmistificar o tema. Sei que muitas crianças chegam a esta situação sem nenhuma informação. Isso mesmo! Em pleno século XXI e independentemente da classe social. Algumas meninas demonstram revolta, repudiam e, muitas vezes, se fecham. Outras comemoram e recebem como um troféu.
Outra situação bem comum, o receio, após ser cuidada (higienizada) e ensinada a usar o absorvente, é de sair do banheiro achando que todos os olhares refletem a condição em que está. Acha que o absorvente está marcando a roupa e que será o comentário de todos. Neste momento, gerar segurança é essencial. Ir até um espelho e mostrar que está tudo bem, a deixará mais tranquila. Nada de dizer “que bobagem”. Jamais desmerecer seus sentimentos. O apoio a fará enfrentar esta nova situação com tranquilidade e sem traumas.
O próximo passo foi incentivá-la a dar a notícia aos pais. Uma introdução feita por mim para dar uma mãozinha e, em seguida, a troca de amor com a família, a fez sentir mais preparada para o retorno ao lar. Se não tivesse feito isso com ela, seriam horas pensando em como enfrentaria a família para dar a notícia. Desta forma, eliminamos um desconforto e, juntas, vencemos mais essa barreira.
Passado todo este primeiro impacto, já programei, na minha agenda, procurá-la no outro dia para verificar os seus sentimentos e para dar algumas dicas e orientações. É muito importante ensiná-la a marcar em um calendário o período menstrual. Assim, ela se poderá se preparar com um kit menstrual (absorvente extra; uma toalhinha; um sabonete; uma bermuda), além de poder anotar os sintomas e assim ir conhecendo o seu corpo. Outra recomendação é a visita ao médico para orientações adequadas e acompanhamento.
Hoje, vejo os pais mais envolvidos na acolhida, mas alerto quanto à necessidade do preparo. É preciso preparar as nossas crianças para este período. Consulte o médico e investigue quanto à idade possível para que isso possa ocorrer. Assim, não antecipará fase, mas também não a deixará no escuro, sendo surpreendida repentinamente.
Se a primeira menstruação ocorre quando ela estiver com a família, na escola ou com alguém da sua confiança, tudo bem. Mas se ela deparar com esta situação em um ambiente desconhecido ou desconfortável? O preparo será essencial para a tranquilidade e desenvoltura com tal novidade.
Vamos orientar e acolher nossas crianças que, por se apresentarem “tão saídas” com o mundo moderno, achamos que estão prontas e muitas vezes, falhamos com elas. Fica a dica.