1ª Cena
– “Boa tarde, filho. Como foi a escola?
– Mamãe, me tira desta escola. Eu não quero ver ninguém de lá mais. Os garotos estão rindo de mim por causa do meu tênis. Eu vou jogar este tênis fora.
– Mas filho, você desejou tanto este tênis. Seu pai trouxe da última viagem para agradar você.
– Mãe, o eu gosto do tênis, mas virei piada na escola por causa dele.“
2ª Cena
Criança entra no carro após a escola.
– ”Mãe, nem vem falar comigo. Não estou de conversa.
– O que aconteceu filho?
– Não quero mais saber desta escola.
– Mas você ama a escola e seus professores!
– Mãe os colegas não me deixam em paz. Falam que meu cabelo é esquisito e que eu sou estranho.”
Situações como essas ocorrem diariamente no âmbito escolar ou em qualquer lugar onde ocorre reunião de crianças e adolescentes: família; igreja; parques; cursos extras (inglês e esporte). E como entender estes conflitos?
Primeiro, deixar claro que os conflitos exemplificados foram gerados por provocações. Provocações levam à humilhação, constrangimento e chegam a repelir o provocador e até gerar agressão. Ser provocado gera insatisfação, tristeza ou reação. Depende do conteúdo interno de cada criança.
Percebe-se, muitas vezes, que alguns provocadores se divertem com a dor do outro e, quando abordados, se defendem como se isso fosse “apenas” um ato de brincadeira. Vale ressaltar que brincadeira é quando duas ou mais pessoas se divertem. Neste caso, o provocado não está divertindo nem um pouco.
Uma situação muito interessante é o como a criança provocada recebe a provocação. Sua receptividade irá de acordo com a sua autoestima. Crianças fortalecidas na autoestima têm uma reação de defesa muito interessante e muitas vezes nem se sentem provocadas. Agem com naturalidade e seu emocional não é afetado. Sentem-se seguras com a sua imagem ou com a fase que estão vivenciando e ignoram a atitude do agressor. O agressor por sua vez, não completando o seu papel de ofensor, desiste desta criança e parte para uma nova vítima.
Diante desta constatação, fica muito claro o quanto devemos trabalhar o amor-próprio em nossos pequenos. Mostrar o seu valor e falar das fases que estão vivendo ou viverão ou darão o suporte necessário para se defenderem dos colegas que possuem este hábito de humilhação.
Ter um olhar para a fragilidade do nosso filho é o primeiro passo. Por que ele se afeta tanto com a opinião do outro? Por que desistir de um tênis tão desejado por um único comentário? Por que a opinião dos pais fica tão pequena diante da opinião de um único colega que tem um comportamento sarcástico?
O trabalho da família com o seu filho precisa ser em parceria, se possível, com o local onde os dois ou mais colegas frequentam, seja escola, família, esporte, curso de Inglês, porque o agressor também precisa ser trabalhado. É preciso dar a chance de questionar a criança também: Por que você sente prazer em humilhar o colega? Qual o motivo de exercer este papel de provocação? Você já experimentou se colocar no lugar do outro? Você se percebia inconveniente e, por isso, tem repelido os amigos?
As crianças envolvidas, sem exceção, precisam de orientação e acompanhamento. Os dois lados da situação mostram a falta de maturidade em relação ao outro e a vulnerabilidade psicológica que isso gera.
As provocações podem ser imitativas (cópias de exemplos de adultos) ou maldosas. Algumas crianças pequenas muitas vezes nem sabem o significado dos “palavrões” ou ofensas. Simplesmente falam e fazem. Cheguei a atender um grupo de crianças que acha engraçado fazer rimas com nome dos colegas associados com palavras chulas/vulgares. Não tinha a mínima ideia do que estava falando ao reproduzir determinada palavra.
Acontece que a criança que se sente vítima e sofre com as provocações pode desenvolver ansiedade e estresse. Além de acentuar a baixa autoestima. Reclamar do local onde sofre tais provocações é bem natural, porque deseja evitar a exposição a este quadro. Isso fica bem compreensível quando descreve o quadro recheado de dores e angústias.
Algumas crianças sofrem caladas. Não partilham e não pedem ajuda. Temos que ter um olhar bem atento às mudanças de comportamento. Motivar as crianças a partilharem seu dia é sempre muito favorável para conhecê-la.
E como podemos ajudar nossos filhos a reagir às provocações? Desenvolva ferramentas onde ela se sinta fortalecida e não complete o papel do outro (provocar).
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Ao falar sobre a provocação, pergunte ao seu filho se ele concorda com o que o provocador falou. Ex: “Seu cabeça de ovo!” “Filho, você acha que a sua cabeça tem formato de ovo? Como é cabeça de ovo?”
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Outra ferramenta é a indiferença. Mostrar que o que não faz sentido a ele não merece atenção. Ex: “Seu fedido peidorreiro”. Se sou “punzeiro”, entendo que o que ele falou deve ser pelos odores que exalo, mas se não sou peidorreiro, isso não me afeta.
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Usar a estratégia de manifestar o descontentamento também é uma boa saída. Ex: “Corre, seu gordo!”. “Olha, não gosto de ser chamado assim e meu nome é… Se você continuar com essa fala, não seremos amigos.” Aqui ele busca respeito e impõe este limite.
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Uma ferramenta muito bacana é o “pingue-pongue” imaginário. O colega ofende e eu rebato a ofensa com uma reflexão. Ex: “Você é burro por não saber isso até hoje.” “Sério que você pensa assim? Que pena que é isso que você tem a oferecer.” Isso gera um sentimento de escudo e devolução ao outro.
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Transformar a ofensa em elogio é outra boa saída. Deixa o provocador um tanto sem ação. Ex: “Seus óculos são ridículos!” “Agradeço a sua opinião.”
Perceber que o filho está com baixa autoestima e, por isso, recebe as provocações, se entristece e entristecendo-se, alimenta o provocador, não resolve nada se não se buscar uma forma de ajudá-lo. Culpar o provocador ou o local onde o cenário acontece também não é o caminho.
Assuma a situação ao lado de seu filho, ensine-lhe ferramentas de defesa, compare a evolução dele consigo mesmo e comemore o crescimento. Infelizmente deparar com provocadores e conflitos tem sido muito mais comum do que imaginamos nos dias atuais. Vamos à luta!