Tenho me preocupado com as nossas atitudes em relação ao imaginário infantil. Será que a realidade atual está permitindo com que as nossas crianças possam utilizar a riqueza desta ferramenta?
Vivemos uma situação atual de muita incompreensão diante de uma criança criativa e imaginativa. Agimos como se fôssemos responsáveis em puxá-las para realidade adulta. Vamos pensar um pouco: criança tem que ser criança, certo? Precisa criar, dramatizar, cantarolar e aos poucos ir transitando entre a emoção e a razão. A construção do pensamento racional será feita à medida que ela for crescendo. Isso significa que permitir à criança criar, ler histórias infantis e eleger heróis não a fará infantilizada posteriormente. Ela apenas consegue sonhar acordada e ainda partilhar com os amiguinhos reais e imaginários, mas depois entenderá quem são os verdadeiros heróis.
Esse movimento infantil permite a ampliação do vocabulário, aguça a curiosidade infantil e ainda proporciona repertório para que possa, futuramente, ser autora de suas próprias histórias. Esta riqueza tem sido confundida no ato de educar de muitos pais quando os mesmos acusam a criança de ser mentirosa ou dramática ao contar para família experiências recheadas de invenções. O medo familiar em não conseguir trabalhar valores está tão exacerbado e confuso que estamos perdendo a riqueza infantil. Frases como: Isso não é verdade! Você está mentindo! Pare de inventar! estão sempre prontas em nossa boca.
O equilíbrio está exatamente em olhar para esse ser com a idade que ele tem. Não é porque as nossas crianças estão espertas e além da nossa época que isso nos faz agir com elas como se fossem mais velhas. As crianças precisam ser tratadas e respeitadas conforme a fase em que se encontram.
A literatura infantil traz elementos em seus contos de fadas, por exemplo, que muito contribuirão no desenvolvimento das nossas crianças: dilemas existenciais descritos de forma simplificada e com leveza. Isso proporciona ao leitor aprender a lidar com situações que aparecerão em sua vida: medo, angústia, perdas, conflitos. O imaginário agirá no subconsciente dando recursos de sobrevivência às dores emocionais e a tomadas de decisões.
Antecipar as fases tem prejudicado muito o desenvolvimento das nossas crianças e precisamos acordar para isso. E voltando ao imaginário, estamos em plena época de Natal… O que você programou para aguçar o imaginário da sua criança envolvendo o Papai Noel? O que o Papai Noel representa para a sua família? Já pensou em transformar essa figura, muitas vezes trazendo só bens materiais (brinquedos, eletrônicos e hoje até dinheiro em envelopes), em uma figura que possa trazer mensagens de reflexão? Um Papai Noel que incentive os estudos e a participação da família para um mundo melhor? É, podemos apresentar um Papai Noel que aguce a vontade das nossas crianças para pensar em ações que permitam uma mudança social, sem perder a alegria do presente que receberá também. Afinal, a criança aguarda muito este momento.
Uma criança com riqueza no imaginário é uma criança mais feliz. Dar asas para sonhar, fazer e acontecer é colheita certa de uma mente mais resistente às castrações futuras. Segundo Fanny Abramovich, “O ouvir histórias pode estimular o desenhar, o musicar, o sair, o ficar, o pensar, o teatrar, o imaginar, o brincar, o ver o livro, o escrever, o querer ouvir de novo (a mesma história ou outra). Afinal, tudo pode nascer dum texto!”.
Terminarei esta reflexão com um convite! Que tal tirar uma horinha do seu dia para ler com a sua criança, diariamente? Permita-se dar asas ao seu imaginário também. Relembre as histórias que você ouvia e mergulhe nesta aventura. Desta forma, vocês irão construir um vínculo em um momento lúdico que facilitará futuramente quando precisarem conversar sobre as etapas racionais da vida.