A minha vontade de acertar como pai acabou por permitir que ele se sentisse assim (*)

Recebi os pais, que foram pontuais. Percebia que estavam ansiosos pelo encontro. A educação da família vem de berço. Os pais são muito educados, receberam uma educação recheada de valores, ética e princípios e, por isso, Gabriel me encantou. Ele tinha de onde puxar.
Começamos a conversar. Percebi, a cada narrativa, a inquietude na cadeira do pai. A mãe, muito atenta, sempre foi uma fiel companheira da família.
Estava diante de um pai à moda antiga. Desses pais que desejamos muito nos dias de hoje. Aquele pai que coloca regras, que prepara o filho para vida, oferece a vara e ensina a pescar, sabe?


Um pai jovem, porém muito guerreiro, que construiu uma estrutura sólida iniciando a sua luta aos 15 anos de idade. Que soube dividir o tempo entre estudos, adolescência e trabalho com os empreendimentos da família.
A mãe, uma vitoriosa. Veio de uma educação na qual soube diferenciar o que queria e o que não queria para a sua vida. Muito estudiosa, não permitiu que a união matrimonial a impedisse de permanecer crescendo profissionalmente.
Então, com pais tão exemplares, daqueles que sonhamos encontrar como educadores e terapeutas, o que estava acontecendo?
Não existia erro na escola do “como trilhar o caminho para o Gabriel”. Apenas faltava diálogo. Um diálogo aberto, com fala e escuta. Faltava conhecimento entre ambos, um mergulho em entender como pai e filho funcionam, precisava parar de se criarem expectativas para não gerar frustrações. Faltava demonstração de amor e perceber que alguns conflitos eram por amor. Complicado?
Não! Nós que complicamos. Acontece que, com uma história de vida recheada de garra e responsabilidade desde cedo, e com o desejo de que o filho seja um homem íntegro entre tantas tentações do mundo, acabou-se por não conseguir que o filho compreendesse que o jeitão de ser e querer não permitia que esboçasse com leveza as suas intenções.
Um outro fator determinante é que pai e filho são muito parecidos fisicamente, no jeito de resolver as coisas e nos planos de vida. Muita semelhança entre eles e, então, entram os sentimentos, medos e receios do pai quando se depara com a imagem refletida no filho. Explico! Sabe quando nos deparamos com o que temos em nossa forma de ser e agir, mas sofremos por ter e encontrarmos esse mesmo jeito em um dos nossos filhos? Daí acabamos por ser duros com esse filho por proteção. Entende?
Ao conversar com esses pais e mostrar que não há erros e sim, ajustes, ao ir pontuando que esse filho já internalizou todos os ensinamentos que foram muito bem construídos e que agora é trabalhar com ele para mantê-los, não fugir do caminho trilhado, eles foram se acomodando nas poltronas. Parecia que a culpa e o mal-estar estavam dando lugar à compreensão.
Os pais foram convidados a olhar para este filho a partir dos sentimentos dele. Através da escuta que fiz. O olhar pela compreensão que ele tem de toda a relação permitirá que os pais percebam que a única coisa que esse filho deseja é fazer parte da família de forma atuante, responsável e harmoniosa.
O filho tem deslizes, mas qual adolescente não os tem? Isso não pode impedir de permitir que ele expresse seus desejos, assim como os pais coloquem as regras para a conquista.
A sessão termina com um olhar esperançoso de que um novo ciclo se iniciará. Pedi para os pais que envolvam esse filho nos negócios da família e que, ao mesmo tempo, eles se envolvam com a rotina dele. Eu vejo ali uma relação forte e muito feliz entre eles.
A despedida aconteceu parcialmente. Por quê? Porque eu deixei um pouquinho de mim ir com eles e fiquei com um pouquinho deles. Para mim, foi maravilhoso poder estar com pais tão comprometidos na criação dos filhos. Eu estava diante de um grande exemplo de família.

(*) Continuação de Não me sinto amado por um de meus genitores

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